Aos que não me conhecem, tenho duas principais atuações profissionais: sou mediadora de conflitos e também advogada.
Ambas as profissões exigem, pela sua própria natureza, a habitualidade de agir em situações de adversidade, ou seja, quando uma CRISE se instaura! Acredite, este requisito é demasiadamente exigido nos bancos acadêmicos, somos treinados para o enfrentamento da pior situação possível.
Fato é, mesmo nas piores situações hipotéticas, incitadas por meus mestres, nunca se aproximou da real conjuntara que vivemos neste março de 2020. Imagine alguém lhe contando: “Olha! Em 2020, as atividades sociais, o trabalho a educação e o lazer serão desempenados on-line, pois a população mundial estará vivenciando uma quarentena, sem prazo para se encerrar”. Não há porque pensarmos nesta hipótese, a crítica acadêmica diria, é muito pouco provável um cenário como este; se não em filmes de ficção científica. A realidade nos albarrou.
Trago uma das reflexões problemáticas ao mundo jurídico e social. Tenho recebido consultas de mulheres em situação de vulnerabilidade dentro de suas casas. O medo do vírus, o medo da escassez de recursos, o medo do futuro, nada disso é justificativa para o desrespeito ou abuso à mulher.
A pressão da realidade pandêmica poderá gerar a potencialização dos momentos de tensão entre o casal. Todavia, cabe à mulher identificar o quais situações ultrapassam a normalidade.
Algumas dicas, de como identificar violências:
Violências Psicológica: Humilhações, ridicularizações ou ameaças;
Violência Sexual: Sexo forçado, sexo em troca de bens, impedir método contraceptivo;
Violência Moral: Xingamentos, injúrias calúnias, difamações;
Violência Física: Tapas, socos, queimaduras, amarras, apertões;
Violência Virtual: divulgar fotos íntimas, propagar comentários depreciativos;
Violência Patrimonial: quebrar celular, rasgar fotos, quebrar móveis;
O que podemos fazer?
Nossa ação, como parte desta sociedade que hoje desenvolve-se 20 anos em 20 dias, agirmos com acolhimento. A mulher que identifica atitudes abusivas, tende a sentir-se solitária. Aos que puderem, neste período de isolamento, solidarize-se, forme uma rede de apoio diário. Pequenas conversas, escute o que ela tem a dizer sem fazer julgamentos, faça ligações em horários alternativos para uma simples checagem. Algumas breves atitudes podem gerar um grande empoderamento à vitima.
“Quarentena não significa ausência de Lei. Quarentena não significa revogação da Lei Maria da Penha. Os direitos continuam a valer. Se vocês presenciarem ou ouvirem alguma situação de violência domestica, liguem para 180 ou 190. Não se calem, porque JUNTAS, somos muito mais fortes.” Dra. Valéria Scarance – Promotora de Justiça especializada no enfrentamento da violencia contra a mulher.
E juridicamente?
Analisando sob a ótica da maioria das mulheres que me procuraram, destacam-se três elementos que às aprisionam na manutenção da violência doméstica, quais sejam: econômico, psicológico e afetivo.
No elemento econômico, quantitativamente aparece como o maior impeditivo para a resolução da situação de abuso, sendo que as mulheres adotam um perfil médio de trabalhadoras informais ou autônomas que se vêem dependentes economicamente do marido/companheiro para o sustento da família.
O elemento psicológico, ponto bastante delicado de identificar, tendo em vista que como advogada/mediadora não possuímos formação adequada para tanto, porém a prática reiterada nos casos similares permite-se traçar um perfil comparativo. A mulher sente-se discriminada por estar “sem marido” e a busca por atingir o modelo pré estabelecido da preservação da unidade familiar.
Finalmente o elemento afetivo, que por vezes carrega um viés psicológico, as mulheres encontram-se para com a relação conjugal em co-dependência, ou seja, ela vive constantemente preocupada com o possível abandono (deixar, trair ou rejeitar), via de regra, deixa de lado a sua família e amigos para estar só com o parceiro, chegando a abandonar objetivos e interesses pessoais para agradar o parceiro. Conforme Melody Beattie, que cunhou o termo no final dos anos setenta nos EUA:
“Um individuo codependente é alguém que permite que o comportamento de outra pessoa o afecte, e sente obcecado por controlar o comportamento do outro.” Melody Beattie, em “Vencer a Co-dependencia”
Assim, achegamos nos questionamento jurídico que me fazem: Se eu denuncia-lo, como funcionaria a pensão alimentícia para meus filho? Com o Fórum fechado como posso pedir a pensão?
Respondendo:
Primeiramente, é um orgulho saber que você empoderou-se e decidiu denunciar o agressor (Disque 180, 190 ou 100). Seu caso necessita de proteção, haverá a instauração de dois procedimentos, um junto a Delegacia e outro de Vara de Família. No criminal haverá o seu encaminhamento para a Delegacia da Mulher de sua cidade, que fará a averiguação. No segundo processo, a os olhos do Poder Judiciário, a situação de vulnerabilidade da mulher enquadrada-se em situação de URGÊNCIA, sendo possível que seu advogado requeira liminarmente ao Juiz as medidas cabíveis face ao agressor como: o afastamento do agressor do lar, o pedido de pensão alimentícia para a manutenção da prolê dentre outros.
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Referências:
BUCHER-MALUSCHKE. Júlia S. N. F. A Permanência de Mulheres em Situações de Violência: Considerações de Psicólogas. Psicologia: Teoria e Pesquisa Jul-Set 2014, Vol. 30 n. 3, pp. 267-276. Universidade Federal do Acre Universidade de Brasília. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ptp/v30n3/04.pdf –
MELLODY, Pia; MILLER,Andrea, MILLER,Keith.. (1995). Enfrentando a co-dependência afetiva: o que é, como surge, como prejudica nossas vidas. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos.
MELLODY, Beattie. (2005).Vencer a Co-dependência. Publicações Sinais de Fogo
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